Embora a atribuição de cargo de confiança constitua uma exceção às regras habituais de jornada de trabalho, ela depende de uma cessão real de poder de mando e autonomia ao trabalhador para isentar a empresa do pagamento de horas extras.
Contratada por cerca de três anos como supervisora de um estacionamento, uma trabalhadora de Porto Alegre obteve, na Justiça do Trabalho, o direito de receber as horas extras realizadas durante a relação de emprego. Embora a atribuição de cargo de confiança constitua uma exceção às regras habituais de jornada de trabalho, ela depende de uma cessão real de poder de mando e autonomia ao trabalhador para isentar a empresa do pagamento de horas extras. O acórdão da 5ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-RS) confirmou, nesse aspecto, sentença da juíza da 11ª Vara do Trabalho de Porto Alegre, Cinthia Machado de Oliveira.
“O exercício de função de maior responsabilidade não autoriza, por si só, o enquadramento do empregado na exceção do art. 62, II, da CLT, especialmente quando demonstrado que tal situação não lhe conferiu a fidúcia especial e indispensável para o exercício de encargos típicos de gestão”, resumiu o relator da decisão no Tribunal, desembargador Manuel Cid Jardon. Após trabalhar por nove meses como operadora de caixa, a empregada foi promovida à função de “supervisora operacional”. O registro na carteira de trabalho (CTPS), contudo, não fez referência a um eventual enquadramento no artigo 62, II, da CLT. O referido artigo regulamenta as condições que constituem delegação de poderes de gestão, em particular autonomia para tomar decisões de ordem administrativa e econômica em nome do empregador. Além da falta de registro específico, o relatório do desembargador Jardon não confirmou essa hipótese para o caso em tela.
“A prova oral/testemunhal evidencia que, acima da reclamante, havia um Gerente e Diretores, e que, embora houvesse empregados subordinados à reclamante, ela não tinha autonomia para decidir sobre folgas e férias, que eram decididas pelo Gerente ou pelo RH da empresa. Tampouco há prova de que tivesse autoridade para suspender ou despedir seus subordinados, visto que as penalidades eram aplicadas pelo Gerente. Veja-se que a reclamante sequer podia liberar um cliente que não tivesse como pagar o estacionamento, tendo que ligar para a Central, haja vista a falta de autonomia e de poder decisório. Portanto, não há prova de que a reclamante tivesse efetivo poder de decisão e gestão ou que ela, por exemplo, representasse a empresa perante terceiros”, analisou o magistrado.
No entendimento da 5ª Turma, o simples fato de a reclamante ter empregados subordinados a ela não demonstra, de forma inequívoca, que ela detivesse a autonomia e confiança indispensáveis para o exercício de encargos típicos de gestão. Subordinada a um gerente e um diretor, a trabalhadora estaria em um nível hierárquico mais baixo dentro da empresa, que de modo algum se aproximava da figura do empregador. “A jurisprudência firmou-se no sentido de que a mera responsabilidade técnica, ainda que relevante, não se traduz em atribuição para gerenciar o empreendimento em nome do empregador”, esclareceu Jardon.
Também participaram do julgamento os desembargadores Cláudio Antônio Cassou Barbosa e Angela Rosi Almeida Chapper. Cabe recurso da decisão.
Fonte: TRT4