Um hospital foi condenado por abuso de poder hierárquico ao exigir o comparecimento presencial de trabalhadores para entrega de atestados médicos no prazo de 24h. A decisão é da 1ª Vara do Trabalho de Santos e tem como base ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) em Santos (SP).
Denúncia anônima
A ação teve início após o MPT receber uma denúncia anônima alegando que a Santa Casa exigia a entrega presencial de atestados médicos dentro de 24 horas, sob pena de desconto salarial. A denúncia levou à abertura de um inquérito civil público, onde foram coletadas provas, incluindo gravações telefônicas e depoimentos de funcionários.
Ao longo do processo, o MPT demonstrou o abuso de poder da instituição ao exigir a entrega presencial dos atestados e o comparecimento do empregado perante o médico do trabalho, no prazo de 24 horas, mesmo quando os empregados estão doentes e impossibilitados de se deslocar, para só então, abonar as faltas dos empregados.
Desrespeito à legislação
A prática é considerada desrespeitosa à legislação trabalhista e aos princípios da função social do contrato, da boa-fé objetiva e da dignidade da pessoa humana. “Na ocasião da entrega dos atestados, descobrimos que o empregado é submetido a uma avaliação técnica do seu setor de medicina do trabalho, para, só então, abonar as faltas”, explica o procurador do Trabalho Rodrigo Pedroso Lestrade.
“Submeter empregados enfermos ao obrigatório comparecimento presencial em 24 horas, quando residem distante do local de trabalho, e quando encontram-se em situação muitas vezes delicada de saúde, inclusive com limitações físicas e psicológicas, não é uma atitude empresarial que cumpre com o princípio da boa-fé objetiva, que impõe ao empregador uma conduta positiva, de proteção e lealdade para com seus empregados”, argumenta o procurador do Trabalho em sua peça inicial.
Alegações
“Em tempos de grande difusão de meios de comunicação, quando há modernos smartphones disponíveis à grande maioria da população, bastando um simples toque na tela destes aparelhos para enviar documentos, não é sensato que a ré, seja em razão de absoluta falta de organização estrutural, seja mesmo por mero capricho, ordene que seus empregados ainda doentes e impossibilitados compareçam ao local de trabalho e tenham de fazê-lo, até mesmo correndo risco de transmitir doenças infectocontagiosas aos profissionais que lá trabalham ou a pacientes e visitantes”, finaliza Rodrigo Lestrade.
Ao proferir a sentença, a juíza destacou que “não se pode exigir que todo trabalhador que apresenta atestado por moléstia de menor gravidade, como a gripe, saia do curto período de repouso necessário à recuperação de sua saúde para apresentar-se ao médico do trabalho e assim demonstrar que fala a verdade quando alega estar inapto ao trabalho. A presunção é a de boa-fé, e incumbe ao empregador o ônus de providenciar o deslocamento do médico do trabalho até a residência do empregado quando da suspeita de abuso de direito na apresentação do atestado”.
Danos morais
“O Juízo reconhece o abuso de direito da ré ao exigir o comparecimento pessoal do trabalhador perante o médico do trabalho no prazo de 24 horas do início do afastamento, o que acarreta abalo moral à coletividade dos empregados, bem como à sociedade, passível de indenização”, afirma a juíza do Trabalho, que definiu o valor da indenização por danos morais sociais em R$ 50 mil, a ser revertida em favor do Fundo de Amparo ao Trabalhador.
Esclarecimentos restantes
O MPT interpôs embargos declaratórios a fim de que a juíza da 1ª Vara do Trabalho de Santos esclareça alguns pontos que ainda restam obscuros na sentença, como o pedido do MPT para que o hospital seja proibido de efetuar descontos nos salários dos empregados que porventura não conseguirem entregar o atestado médico nas 24 horas seguintes ao afastamento.
Fonte: MPT