Por Cláudio Candiota Filho, advogado (*)Não será surpresa se as diretorias das companhias aéreas atingidas pela decisão judicial não orientarem seus funcionários sobre os procedimentos que devem seguir para fornecer, espontânea e civilizadamente, a declaração de atraso de vôo.
Talvez até façam questão de não informar seus funcionários sobre a liminar para “
testar” os advogados e verificar até onde estão dispostos a ir para obter o cumprimento da liminar.
A verdade, é que na petição inicial da ação coletiva de consumo da OAB/RS consta um modelo de formulário utilizado pelas empresas aéreas na Espanha. Algo muito simples. Por óbvio, se as companhias aéreas agissem de boa-fé, em conformidade com o Código de Defesa do Consumidor, bastaria copiar o formulário que está na petição, tirar várias cópias e disponibilizá-las em todos os seus balcões de “
check-in”. Veja-se a singeleza do texto do documento fornecido aos passageiros, na Europa: “A QUIEN CORRESPONDA: Por la presente y a solicitud del pasagero (...nome... ) perteneciente a nuestro vuelo nº......./ Data:...., certificamos que el vuelo anteriormente mencionado, sufrió una demora de ...... horas debido a ........ Firmándose el presente cerficado em Madrid a .............. de ................ de 2007”.
Na Europa, basta pedir o formulário no balcão da companhia aérea. No Brasil a Ordem dos Advogados precisa ajuizar uma ação na Justiça Federal.
Na Europa essa declaração é fornecida naturalmente, bastando apenas ao passageiro consumidor, solicitá-lo no balcão da companhia aérea. No Brasil, a Ordem dos Advogados do Brasil e o Ministério Público do RS precisam ajuizar ações para que documento nos mesmo termos seja entregue aos passageiros.
Assim, é melhor não sonhar com o improvável. As companhias aéreas brasileiras não vão adotar a singela medida. Possivelmente, será necessário requerer ao Juízo expedir uma ordem de prisão contra o presidente da companhia para que a liminar seja cumprida. Há, portanto, enorme diferença de tratamento entre fornecedores e consumidores europeus e entre as mesmas partes no Brasil.
O que se pretende com a ação coletiva é garantir o acesso pleno a um serviço público essencial e contínuo, garantido pelo artigo 22 do CDC, artigo 37, parágrafo 6º e 175 parágrafo 4º, da Constituição Federal, garantindo-se também o ressarcimento dos danos materiais e morais dos consumidores-advogados inscritos junto à OAB/RS. O que se pretende, portanto, é o mero cumprimento da lei e da Constituição por parte das companhias aéreas. Nada mais.
E por que nem a lei, nem a decisão judicial serão cumpridas pelas companhias aéreas? A resposta é simples e pode ser encontrada no acórdão do ministro Ruy Rosado de Aguiar: “
Qualquer fornecedor responde nos termos do CDC, mas a transportadora aérea insiste em se distinguir dos demais, apegada a um privilégio que não tem razão de ser, nem se ajusta ao ordenamento jurídico nacional, onde o princípio da igualdade deve presidir as relações de direito privado” (REsp nº 247.724 – STJ, 12/06/2000).
Ora, se as companhias aéreas descumprem o CDC, mesmo após 17 anos de vigência, e se nada mudou oito anos depois da publicação do acórdão acima citado, não se pode esperar o cumprimento pacífico da liminar obtida essa semana.
Portanto, num primeiro momento, será necessário fazer a prova do descumprimento. A juíza federal Maria Isabel Klein, em sua decisão, determinou que “
ocorrendo o descumprimento desta ordem liminar, a parte autora deverá comprovar tal fato documentalmente a este Juízo, por meio da juntada do bilhete aéreo, a partir de cuja data será contada o início da imposição da multa”.
Então, o que nós, advogados, precisaremos fazer será comprovar o descumprimento. Como?
Sugere-se, em princípio, salvo idéia melhor, o que segue:
1 - Uma declaração de próprio punho, elaborada e assinada, na hora, por duas testemunhas, por exemplo, por dois passageiros que estiverem na fila do check-in;
2 - Anotar o nome da funcionária da companhia (todas têm crachás), hora, nome da empresa, número do vôo, aeroporto e posição de atendimento. Como temos direito à inversão do ônus da prova, a empresa teria de provar que não existe funcionária com tal nome, que ela não estava atendendo naquela posição, naquele horário, e que a posição não existe. Vai ficar bem difícil para a cia aérea desfazer a prova com esses dados anotados.
3 – “
Escanear” tudo – a declaração de próprio punho e o bilhete aéreo (ou e-ticket) - e enviar para a OAB/RS – e-mail:
[email protected]Há uma vantagem no fato de a OAB/RS estar na liderança dessa ação, porque advogados não terão nenhuma dificuldade em elaborar uma declaração de duas ou três linhas, na hora. Mas, apenas para facilitar, segue um texto para avaliação dos colegas, também aberto a sugestões e simplificações.
DECLARAÇÃO (DE PRÓPRIO PUNHO )
Declaro que na data de ...../......./2008, às ............ horas, no Aeroporto de ..............., no Balcão da Cia Aérea .............., na posição nº. .........., a funcionária de nome..................., não forneceu a declaração de atraso do vôo ................., conforme estabelecido em decisão liminar da Justiça Federal. A funcionária demonstrou total desconhecimento da matéria. O vôo tinha como destino à cidade de ............... . O documento vai assinado por duas testemunhas que se encontravam na fila [nome (endereço e telefone?) e nr. da identidade e/ou CPF] das duas testemunhas. Local, .......... Data:...... Nome:.............. OAB/RS ............ Assinatura ......................
De posse dessas declarações, a OAB/RS irá peticionar, requerendo a aplicação da multa, o aumento de seu valor e, se necessário, em caso extremo, a expedição de ordem de prisão dos diretores da empresa.
Lamentavelmente, todo esse esforço é necessário apenas para que se possa obter das companhias aéreas o simples cumprimento da Constituição Federal e do Código de Proteção e Defesa do Consumidor. É inacreditável !
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