A 5ª câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ/RJ) aplicou a teoria do desvio produtivo no caso de uma mulher que teve o carro arrastado após um ônibus de transporte público bater em seu para-choque. No entanto, condenou a autora em litigância de má-fé por omitir que tinha seguro para o carro acidentado. Em 1º grau, a sentença condenou a empresa de transporte a pagar 5 mil 817 reais e 18 centavos de danos materiais e 2 mil reais de danos morais.
A ré buscou na apelação que os danos materiais fossem limitados ao valor da franquia do seguro da autora, bem como a improcedência do pedido de dano moral. Foi requerido também o reconhecimento de litigância de má-fé por parte da autora, que omitiu a realização dos serviços pelo seguro. De início, a desembargadora Cristina Tereza Gaulia, relatora do recurso, consignou que a apólice de seguro da autora previa o pagamento de franquia, o que efetivamente ocorreu, tendo a seguradora informado, no documento já referido, ser de 1 mil e 89 reais o valor pago a tal título pela segurada: “O restante dos custos de conserto do veículo foi arcado pela mesma seguradora, não havendo, neste jaez, valores a serem pagos pela transportadora ré”.
Com relação aos danos morais, a relatora lembrou que recentemente o Órgão Especial do TJ/RJ revogou a súmula 75, que dizia respeito à inexistência do dano moral em casos de mero aborrecimento. “Atualmente a questão da indenização pelos danos imateriais está submetida à teoria do desvio produtivo, que classifica como dano moral a perda de tempo útil da vida das pessoas para resolver questões recorrentes de sinistros, eventos danosos e outros fatos que poderiam vir a ser resolvidos sem que a parte tivesse que vir a juízo. Os transtornos e aborrecimentos na hipótese, que ora se analisa, foram ademais inequívocos”.
A desembargadora afirmou que, muito embora a teoria tenha nascido no âmbito das relações de consumo, onde diuturnamente ocorrem os desvios produtivos, por analogia, também em qualquer outra sede, pode a teoria endossar a fixação da indenização moral. “A reiterada e constante prática imprudente dos motoristas de ônibus coletivos, no trânsito da cidade do Rio de Janeiro, é comportamento diuturno, e os veículos das concessionárias de transportes coletivos geram um percentual altíssimo de acidentes e, consequentemente, abundam sobremodo as ações judiciais indenizatórias. ”
Para a julgadora, mesmo que não se considerasse a aplicação do desvio produtivo, é inegável que o susto, os transtornos, os intensos aborrecimentos, a falta do veículo durante dias após o fato, são situações vivenciadas pela autora que configuram o dano moral. Apesar de manter a condenação da empresa a pagar danos morais à autora, a relatora da apelação concordou com a tese de litigância de má-fé quanto ao pedido de indenização por danos materiais. “A omissão da existência do seguro, e o reparo integral pela seguradora, tendo a autora que desembolsar somente a franquia, constitui a litigância de má-fé apontada na lei”.
Assim, por maioria, o colegiado reformou, apenas em parte, a sentença, condenando a ré a pagar à autora, a título de danos materiais, tão somente o valor desembolsado com a franquia, e, reconhecendo a litigância de má-fé, fixando multa a ser paga pela autora de 5% sobre o valor atualizado da causa, multa essa que não estará albergada pela gratuidade concedida.
Processo: 0421216-22.2015.8.19.0001
Fonte: Migalhas