Decisão reconhece estado de necessidade pela fome, em tentativa de furto de peças de carne


29.05.07 | Criminal

Uma decisão da 2ª Turma Criminal do TJ-DFT livrou um pai de família de responder a processo criminal, reconhecendo o "estado de necessidade provocado pela fome". A origem da discussão penal foi uma tentativa de furto de duas peças de carne dentro de um supermercado em Ceilândia.

O acusado não conseguiu levar o produto para casa porque acabou sendo detido pelos seguranças do estabelecimento. Por maioria de votos, os desembargadores decidiram rejeitar a denúncia oferecida pelo Ministério Público, admitindo a excludente de antijuridicidade.

O recurso em sentido estrito, oferecido pelo MP, foi interposto contra decisão da 1ª instância, que também rejeitou a denúncia. Para a Procuradoria, o andamento regular do processo criminal é que poderia ou não revelar o estado de necessidade. O desembargador relator concordou com o Ministério Público, mas os dois vogais que compunham o quórum discordaram.

De acordo com o voto que servirá como base para o acórdão, a conduta do pai de família pode até ser considerada “censurável” do ponto de vista moral. Mas, pelo princípio da insignificância, sua atitude não é relevante, a ponto de justificar a intervenção do Estado, e a conseqüente instauração do processo crime.

Ainda segundo o voto da maioria, o processo penal deve ter uma causa relevante, ou seja, aquela que requer uma resposta justa e adequada do Judiciário, diante de uma conduta formal e materialmente típica. Esse modelo penal, segundo os Desembargadores, não está presente no caso: “quem tenta furtar um quilo de carne, não visa a aumentar seu patrimônio, mas age por fome, afastando-se a ilicitude pelo estado de necessidade”, esclareceram.

Na avaliação da maioria da 2ª Turma, a perda de pouco mais de R$ 40,00 — valor atribuído pelo supermercado às peças de carne — não é significativa para uma pessoa jurídica.

O pai de família afirmou nos autos que tentou furtar a carne para alimentar a família. Segundo informações do processo, ele possui dois filhos e uma esposa sob seu sustento. Paga o aluguel da casa onde moram, e arca com todas as despesas. É autônomo, mas está desempregado.

Segundo o artigo 23 do Código Penal, não há crime quando o agente pratica o fato em estado de necessidade. Pelo artigo 24 do CP: “Considera-se em estado de necessidade quem pratica fato para salvar de perigo atual, que não provocou por sua vontade, nem podia de outro modo evitar, direito próprio ou alheio, cujo sacrifício, nas circunstâncias, não era razoável exigir-se”. E, conforme o artigo 43 do Código de Processo Penal, a denúncia será rejeitada quando o fato narrado não constituir crime. (Proc. nº 20060310236435 - com informações do TJ-DFT).