Uma médica de um hospital público de Santa Maria, grávida, obteve o direito à licença não remunerada para acompanhar o marido, militar da Força Aérea, transferido para outro país. Na análise do caso, a 4ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT4) utilizou o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero.
A trabalhadora ingressou com ação reivindicando o direito de acompanhar o marido durante o período em que ele permanecer no Canadá a trabalho. Conta que teve os pedidos feitos administrativamente ao hospital onde trabalha negados, mesmo argumentando estar grávida e precisando da ajuda do marido por perto.
Fundamentou o seu pedido pela analogia à Lei 8.112/90, que é o Estatuto do Servidor Público, onde há essa previsão legal. Argumenta que o conceito de servidor público abrange não somente aqueles que se vinculam à Administração Direta, mas também os que exercem suas atividades nas entidades da Administração Indireta, como é o caso da médica que trabalha em um hospital vinculado ao Ministério da Educação.
Já a empresa sustenta que não pode conceder a licença não remunerada para acompanhamento de cônjuge por não constar nas normas internas da instituição. Justifica, ainda, que é uma entidade que atende 100% dos pacientes pelo Sistema Único de Saúde (SUS), e que a saída de uma médica anestesiologista, como é o caso da trabalhadora, poderia provocar uma suspensão de atendimentos hospitalares, já que não há substitutos imediatos. Sustenta, ainda, que o interesse particular não pode se sobrepor ao interesse público, sob risco de colocar a coletividade em risco.
O pedido liminar feito pela trabalhadora foi deferido e confirmado na sentença da juíza Elizabeth Bacin Hermes, da 1ª Vara do Trabalho de Santa Maria, que concedeu a licença não remunerada pelo prazo de até dois anos.
“Essa peculiar condição pessoal, somada à transferência não provisória de seu esposo, e ainda fortalecida pelo princípio constitucional de absoluta prioridade à proteção da unidade familiar (art. 227 da CRFB), consolida o entendimento do juízo de que as normas internas da reclamada, interpretadas em conformidade com os preceitos legais e constitucionais, permitem a concessão do direito vindicado”, decidiu a magistrada.
A empresa ingressou com recurso no TRT4.
A relatora, desembargadora Ana Luiza Heineck Kruse, negou provimento ao recurso do hospital, utilizando o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero em sua decisão, que foi seguida pelos demais desembargadores da 4ª Turma.
“Portanto, a situação deve ser analisada sob o ângulo do interesse superior da criança e a partir da perspectiva de gênero, de forma a interpretar não só a norma jurídica, mas o ordenamento como um todo, levando em consideração a situação particular da mulher no mercado de trabalho. Não cabe mais ao julgador simplesmente negar um direito sob o simples argumento de ausência de previsão legal, sem explorar a integralidade e coerência do ordenamento jurídico”, diz o acórdão.
Também participaram do julgamento o desembargador André Reverbel Fernandes e o juiz convocado Roberto Antonio Carvalho Zonta.
O hospital ingressou com recurso de revista para o Tribunal Superior do Trabalho (TST).
Fonte: TRT4