Foi publicado o acórdão da 4ª turma do STJ que fixou marco temporal definidor dos créditos submetidos aos efeitos de recuperação judicial em favor de produtor rural que exerce atividade empresária.
Em julgamento concluído em novembro, a turma confirmou, por maioria, a possibilidade de submissão do produtor rural à recuperação judicial, bem como da inclusão das dívidas existentes antes do registro na junta comercial.
Na ocasião do julgamento, o colegiado consignou que o produtor rural, por ser empresário sujeito a registro, está em situação regular ao exercer atividade econômica agrícola antes de sua inscrição, por ser esta para ele facultativa, já que os efeitos decorrentes da inscrição não se equiparam ao empresário comum.
Segundo as advogadas Anna Maria Reis e Joana D'arc Amaral Bortone (Trindade & Reis Advogados Associados), que junto com o advogado Marcus Vinicius Furtado Coêlho defenderam a tese vencedora ao atuar pelos recorrentes, isso se dá porque, para o empresário rural, o registro apenas se transfere do regime do Código Civil para o regime empresarial, com o efeito constitutivo apto a produzir efeitos retroativos – ex tunc – uma vez que a condição regular de empresário já existia antes mesmo do registro. Isso é diferente do que acontece com o empresário comum, cujo registro é obrigatório, limitando seus efeitos ao futuro – ex nunc – pois tal registro é que torna válida e regular a atividade do empresário.
"Em outras palavras, após o registro, o empresário rural passa a ter tratamento diferenciado, simplificado e favorecido, nos termos dos arts. 970 e 971 do Código Civil, adquirindo assim a condição de procedibilidade para requerer recuperação judicial, com base no art. 48 da Lei 11.101/2005 (LRJ), bastando que comprove a exploração da atividade rural há mais de dois anos. Ou seja, para perfazer o tempo exigido pelo dispositivo da legislação especial, computa-se aquele período anterior ao registro, pois já se tratava de atividade empresarial regular", explicam as advogadas.
De acordo com elas, pelos mesmos fundamentos, a 4ª turma do STJ concluiu ainda que não se pode distinguir o regime jurídico aplicável às obrigações anteriores ou posteriores à inscrição do empresário rural que vem a pedir recuperação judicial, ficando também abrangidas pelo pedido as obrigações e dívidas anteriormente contraídas e não adimplidas pelo empresário.
No entendimento das advogadas, conclusão diversa tornaria inviável o pedido de recuperação, posto se tratar de patrimônio único, integralmente sujeito à necessidade de reestabelecimento da empresa.
"No caso em julgamento, ficou comprovado que diante dos valores obtidos via empréstimo cuja execução pleiteava o Banco do Brasil, bem como a natureza do empréstimo – cédula de crédito rural-, eram suficientes para concluir que não se tratava de pequeno produtor rural, mas sim de empréstimo típico de empresário, razão pela qual não há efeito surpresa a justificar a alegada frustração da execução por parte da instituição financeira, dispondo a lei expressamente acerca das vantagens que aufere com o registro o produtor rural, enfatizando sempre o tratamento favorável, diferenciado e simplificado em relação à inscrição na junta comercial e os efeitos dela decorrentes."
Nesse sentido votaram os ministros Raul Araújo, Luis Felipe Salomão e Antônio Carlos Ferreira, ficando vencidos os ministros Marco Buzzi e Maria Isabel Gallotti. O acórdão ainda é passível de recurso, mas ainda assim, as advogadas consideram que este é o primeiro precedente sobre o tema firmado pelo Tribunal, e "certamente servirá de referência para os numerosos recursos que aguardam julgamento da Corte".
Processo: REsp 1.800.032
Fonte: Migalhas