A 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu provimento ao recurso especial de uma empresa para condenar a União a indenizar a empresa por prejuízos sofridos em 1999 com a mudança da política cambial brasileira em 12 de janeiro daquele ano. De acordo com a empresa, ela assinou contrato com a União em dezembro de 1998 para fornecer helicópteros de resgate à Polícia Rodoviária Federal, tendo como base o dólar a R$ 1,19, de acordo com média dos meses anteriores.
Após a desvalorização de 70% do real frente ao dólar, a empresa chegou a pagar R$2,10 no câmbio em março de 1999, época da entrega de uma das seis unidades. Ao todo, a empresa alegou haver sofrido prejuízo superior a R$ 6.500.000, em valores da época, em razão do que teve de pagar pelos helicópteros para cumprir o contrato. Para o ministro relator do recurso no STJ, Sérgio Kukina, a disposição contratual que impedia o reajuste dos valores não é capaz de afastar a aplicação da teoria da imprevisão ao caso. O magistrado afirmou que a empresa tem razão ao pleitear o reequilíbrio financeiro do contrato, que foi negado administrativamente três vezes e posteriormente indeferido em primeira e segunda instância na Justiça.
Kukina destacou que a mudança “abrupta” na política cambial na ocasião foi uma situação extraordinária, sendo justa a repactuação dos termos ou, já que o contrato foi cumprido, a indenização pelas perdas sofridas. “Nesse contexto, emerge plenamente justificada, tanto quanto caracterizada, a imprevista e imprevisível alteração do ambiente financeiro presente ao tempo em que formulada a proposta de preço que levou a empresa Líder a sagrar-se vitoriosa na licitação para o fornecimento dos helicópteros. Lícito, pois, que invoque, em seu benefício, os favores da teoria da imprevisão, máxime porque não deu causa à indigitada variação do câmbio”, disse o relator.
O ministro lembrou que o STJ já analisou controvérsias semelhantes a respeito da mudança da política cambial em 1999, tanto nas turmas de direito público como nas de direito privado, concluindo pela aplicabilidade da teoria da imprevisão e pela necessidade da recomposição do reequilíbrio econômico dos contratos, posição manifestada também pelo Tribunal de Contas da União ao analisar o evento.
Kukina divergiu da conclusão das instâncias ordinárias, de que a possibilidade de oscilação da moeda estrangeira consubstancia risco ordinário das operações cambiais. Segundo o ministro, a decisão do Banco Central de deixar de interferir no câmbio configurou situação extraordinária e extracontratual, legitimando a indenização requerida pela empresa.
“Esse desditoso evento ocorreu repentinamente, de modo imprevisível e extraordinário, onerando sobremaneira a contratante particular, motivo pelo qual se revela cabível a repactuação financeira por ela almejada, a fim de preservar a higidez da cláusula econômico-financeira inicialmente acordada com a administração”, fundamentou.
O fato de os helicópteros terem sido entregues e pagos pela administração de acordo com o preço estipulado no contrato “não desautoriza a reposição das perdas sofridas pela empresa que, ainda assim, em tempo hábil, honrou seu compromisso contratual”, concluiu o ministro, cujo entendimento foi seguido pela maioria da Primeira Turma.
Fonte: STJ