A Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 1194, ajuizada pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) contra o Estatuto da Advocacia, que punha em cheque o pagamento de honorários de sucumbência, dentro do estabelecido pelo artigo 21 da Lei 8.906/94, o Estatuto da Advocacia, recebeu nesta quarta-feira (20) o voto de desempate do Plenário, proferido pelo ministro Celso de Mello.
O artigo em debate estabelece que nas causas em que for parte o empregador, ou pessoa por este representada, os honorários de sucumbência são devidos aos advogados empregados. Em seu voto, o ministro, sem reduzir o texto do Estatuto, limitou sua aplicação aos casos em que não haja cláusula contratual que estipule uma orientação contrária.
Ao votar como o relator, Celso de Mello fez prevalecer a linha já defendida pelos ministros Sepúlveda Pertence (aposentado), Carlos Ayres Britto, Cármen Lúcia Antunes Rocha e Ellen Gracie. De forma contrária, ou seja, pela total procedência da ação neste dispositivo (sem a interpretação conforme a Constituição); divergiram os ministros Marco Aurélio, Cezar Peluso, Gilmar Mendes, Joaquim Barbosa e Ricardo Lewandoski.
“Embora pareça uma vitória parcial, a decisão protege de forma fundamental os honorários dos advogados contratados, e estabelece uma norma que defende como um todo a advocacia brasileira”, afirmou o dirigente da Ordem gaúcha, Claudio Lamachia.
Julgamento
Confira, a seguir, a íntegra dos textos questionados e a apreciação de cada um deles pelo Plenário do Supremo:
Artigo 1º - São atividades privativas de advocacia:
Parágrafo 2º - Os atos e contratos constitutivos de pessoas jurídicas, sob pena de nulidade, só podem ser admitidos a registro, nos órgãos competentes, quando visados por advogados.
Por maioria, o Tribunal julgou improcedente a ação com relação a este dispositivo. No dia 4 de março de 2004, o relator da matéria, ministro Maurício Corrêa (aposentado), afastou a alegação da Confederação de ofensa ao princípio da isonomia, bem como à liberdade de associação.
Para a confederação, a contratação de advogados é obrigatória para atos e contratos constitutivos de pessoas jurídicas, e ao mesmo tempo não impõe tal exigência para celebrar quaisquer outros contratos, até de maior envergadura, além de trazer restrições à liberdade de associação garantida constitucionalmente.
A respeito desse dispositivo, o ministro considerou que a norma seria endereçada às pessoas jurídicas, com o objetivo de proteger os atos essenciais à sua constituição, afastando futuros prejuízos que possam advir às partes com elas envolvidas, em decorrência de irregularidades cometidas por profissionais estranhos à área jurídica.
“A ofensa ao princípio da isonomia supõe sempre tratamento desigual a situações idênticas, ou tratamento igual a situações diferentes. Não é o que ocorre na hipótese dos autos, em que todas as pessoas jurídicas são destinatárias do preceito atacado”, ponderou o ministro.
Ressaltou, ainda, que do mesmo modo não caberia alegar que partes de atos jurídicos e contratos da mesma significação jurídica de pessoas jurídicas, ou de maior abrangência, ficam dispensados da observância de semelhantes requisitos. Segundo Corrêa, a importância do registro das pessoas jurídicas advém da segurança dos que com elas tratam, e a interferência do advogado seria a minimização da possibilidade de enganos e fraudes.
Dessa forma, ele julgou improcedente a ação, sendo acompanhado pelos ministros Sepúlveda Pertence (aposentado), Celso de Mello, Ellen Gracie e os ministros aposentados Carlos Velloso e Nelson Jobim. Pela procedência, manifestaram-se os ministros Marco Aurélio, Gilmar Mendes, Joaquim Barbosa, Carlos Ayres Britto e Cezar Peluso, que divergiram.
Artigo 21 - Nas causas em que for parte o empregador, ou pessoa por este representada, os honorários de sucumbência são devidos aos advogados empregados.
Parágrafo único - Os honorários de sucumbência, percebidos por advogado empregado de sociedade de advogados são partilhados entre ele e a empregadora, na forma estabelecida em acordo.
Ao examinar o artigo 21, caput e seu parágrafo único, do Estatuto da Advocacia, o ministro Maurício Corrêa trouxe, em março de 2004, o entendimento firmado no julgamento da liminar, quando se decidiu que a verba de sucumbência pertence, em regra, ao advogado da parte vencedora.
À época, o ministro entendeu que a sucumbência é um direito disponível, e de acordo com o disposto nos artigos 22 e 23 do Estatuto da Advocacia, que asseguraram expressamente que o advogado tem direito aos honorários de sucumbência. “Pertencendo à verba honorária ao advogado, não se há de falar em recomposição do conteúdo econômico-patrimonial da parte, criação de obstáculo para o acesso à Justiça, e muito menos em ofensa a direito adquirido da litigante”, afirmou Corrêa. Ele julgou a ADI procedente em parte, quanto ao artigo 21, caput e seu parágrafo único, para lhe dar interpretação conforme a Constituição, possa haver estipulação em contrário sobre os honorários da sucumbência.
Assim, somente em relação ao parágrafo único, o Tribunal acompanhou, por maioria, o voto do relator, julgando a ação procedente em parte para dar interpretação conforme a Constituição, vencidos os ministros Marco Aurélio, Cezar Peluso, Gilmar Mendes e Joaquim Barbosa.
Sobre o caput do artigo 21, a Corte julgou procedente em parte para dar interpretação conforme a Constituição Federal segundo o recente voto do ministro Celso de Mello, e ainda os de Sepúlveda Pertence, Carlos Ayres Britto, Cármen Lúcia Antunes Rocha e Ellen Gracie, e do relator, Maurício Corrêa.
De forma contrária, ou seja, pela total procedência da ação sem a interpretação conforme a Constituição divergiram os ministros Marco Aurélio, Cezar Peluso, Gilmar Mendes Joaquim Barbosa, Ricardo Lewandoski.
Artigo 24 - A decisão judicial que fixar ou arbitrar honorários e o contrato escrito que os estipular são títulos executivos e constituem crédito privilegiado na falência, concordata, concurso de credores, insolvência civil e liquidação extrajudicial.
Parágrafo 3º - É nula qualquer disposição, cláusula, regulamento ou convenção individual ou coletiva que retire do advogado o direito ao recebimento dos honorários de sucumbência.
Por unanimidade, os ministros julgaram este dispositivo inconstitucional, dando interpretação conforme a Constituição Federal. Eles seguiram o voto do ministro Maurício Corrêa segundo a qual o advogado da parte vencedora poderá negociar a verba honorária da sucumbência com seu constituinte.